O surgimento de um novo calibre nominal traz consigo um universo de possibilidades e questionamentos, destacando-se a recarga. Antes de nos aprofundarmos nos aspectos técnicos desse calibre, é fundamental mantermos a mente aberta às inovações, mesmo que a razão para sua criação não seja exatamente o que desejamos.
Muitas vezes, sentimos que tudo já foi inventado. Então, por que criar um novo calibre?
Os motivos para o surgimento de novos calibres são variados: melhorias na eficiência balística, lobby da indústria ou restrições legais. Esta última, por mais que possamos questioná-la, é uma realidade que precisa ser considerada. Na Itália, por exemplo, o calibre 9x21mm surgiu exatamente por esse motivo, para contornar a proibição do uso civil do 9x19mm Parabellum. Da mesma forma, no México, o calibre .38 Super se popularizou devido a restrições ao uso civil de calibres militares. Esses exemplos ilustram como novas normas podem impulsionar a criação e a adoção de novos calibres, adaptando-se às necessidades legais e de mercado.
Adaptar-se é essencial.
Foi exatamente isso que a Taurus fez ao desenvolver o calibre 38 TPC, demonstrando rapidez em responder às demandas de um público que vem crescendo exponencialmente no Brasil. Essa adaptação demonstra a capacidade da indústria em inovar e se ajustar às novas realidades, garantindo que os atiradores possam contar com uma arma efetiva para suas necessidades.
Normalmente, um calibre não surge de forma isolada, mas é geralmente inspirado em um calibre já existente. É importante destacar que o termo "9mm" refere-se ao diâmetro aproximado do projétil, que é compartilhado com calibres como 380 ACP, 9mm Luger, 38 Super, 38 Spl e 357 Magnum. Embora esses calibres não tenham exatamente o mesmo diâmetro, todos possuem aproximadamente 9mm ou 0,354331 polegadas. Partindo dessa premissa, é natural que o surgimento de um novo calibre devido a restrições legais utilize um projétil que pertença a essa família.
Para entender melhor, extraímos as dimensões do site da SAAMI para os calibres 9mm Luger e 380 ACP e utilizamos informações da Taurus para o calibre 38 TPC. A análise comparativa a seguir ilustra as diferenças e semelhanças entre esses calibres:
PARTE |
380 ACP (mm) |
9mm Luger (mm) |
38 TPC (mm) |
Comprimento Total (OAL) |
23,11 a 24,99 mm |
25,40 a 29,69 mm |
25,40 a 29,69 mm |
Comprimento do Estojo |
17,27 mm |
19,15 mm |
18,30 mm |
Calibre do Projétil |
0,356’’ |
0,355’’ |
0,355’’ |
Base do Estojo |
9,5 mm |
9,9 mm |
9,9 mm |
Boca do Estojo |
9,47 mm |
9,65 mm |
9,62 mm |
Aro do Estojo |
9,50 mm |
10,01 mm |
9,95 mm |
Dessa forma, fica claro que o 38 TPC é mais como um "descendente direto" do 9mm Luger, enquanto se assemelha apenas vagamente, como um parente distante, ao 380 ACP.
Figura 1 - Especificações Técnicas do Calibre 38 TPC
Figura 2 - Calibre 9mm Luger (SAAMI)
Figura 3 - Calibre 380 ACP (SAAMI)
Sobre as Matrizes (Dies de Recarga)
A primeira matriz de recarga tem como objetivo principal restaurar as dimensões originais do estojo, calibrando a parte externa desde a boca até a base. Devido às semelhanças dimensionais entre os calibres, podemos afirmar que a primeira matriz de desespoletamento e calibração usada para o 9mm Luger também pode ser utilizada para o 38 TPC.
A segunda matriz, utilizada para abrir a boca do estojo e prepará-lo para acomodar o projétil, apresenta uma diferença de apenas 0,03 mm, o que equivale a 0,001 polegadas. Essa diferença na calibração de uma matriz é desprezível, pois a abertura da boca é ajustada empiricamente pelo operador, que a abre o mínimo necessário para acomodar o projétil. Por exemplo, o funil expansivo da Dillon Precision possui uma faixa de dimensionamento que inicia em 0,348 polegadas e vai até 0,384 polegadas, e isso é consistente em todas as marcas. Portanto, esse diâmetro da abertura da boca do estojo, é algo que sempre será ajustado pelo operador. Dessa forma, podemos afirmar com segurança que a mesma matriz do 9mm Luger será utilizada para abrir a boca do estojo.
A terceira matriz, responsável pelo assentamento e crimpagem do projétil, realiza duas funções: empurrar o projétil para dentro do estojo e, em seguida, fazer a dobra (taper crimp), que é ajustada empiricamente pelo operador. Esse ajuste é causado por um relevo dentro da matriz. Devido à semelhança no diâmetro, é possível afirmar que a mesma matriz do 9mm Luger será utilizada para assentar e crimpar o estojo do 38 TPC.
Portanto, as matrizes de recarga do 9mm Luger são totalmente compatíveis com as do 38 TPC, garantindo que os operadores possam utilizar o mesmo conjunto de ferramentas sem necessidade de novos investimentos para quem já possui as matrizes do 9mm Luger. Isso é bastante comum; as matrizes de recarga do 38 Special e 357 Magnum, assim como do 40 S&W e 10mm, são as mesmas devido às suas semelhanças.
No entanto, é importante esclarecer que, para aqueles que ainda não possuem as matrizes 9mm Luger e desejam recarregar o 38 TPC, por força de lei, não será possível comprar as matrizes do 9mm Luger. Deverão adquirir as matrizes específicas para o calibre nominal 38 TPC, uma vez que, na análise documental da autorização de compra desses equipamentos, considera-se apenas o calibre nominal do equipamento e o que consta no registro da arma. Isso significa que, apesar da compatibilidade técnica, a regulamentação exige a aquisição das matrizes apropriadas para o calibre registrado, garantindo a conformidade legal e evitando quaisquer complicações burocráticas.
Sobre as Matrizes 38 TPC no Brasil
Os fabricantes americanos já estão cientes da demanda por matrizes específicas para o calibre 38 TPC no Brasil e estão preparados para fornecer esses conjuntos para o nosso mercado. A Recarga Club, a maior importadora desses produtos no país, agiu com diligência e já encomendou os conjuntos de matrizes para atender à demanda.
A expectativa é que, dependendo da necessidade do público e da quantidade de operadores interessados, os primeiros embarques ocorram em aproximadamente 90 dias. Este prazo pode ser reduzido caso os registros e autorizações sejam emitidos rapidamente.
Vale destacar que esse período de 90 dias é mais uma estimativa para gerar demanda do que uma limitação imposta pelos próprios fabricantes, que já estão prontos para comercializar o produto. Portanto, os operadores interessados podem esperar a disponibilidade das matrizes de 38 TPC em breve, com o apoio da Recarga Club, que está comprometida em atender às necessidades do mercado brasileiro.
Se você ainda não comprou uma arma no calibre 38 TPC e está preocupado com a possibilidade de ficar sem poder recarregar, fique tranquilo. Essa é uma preocupação superada, pois as matrizes estarão disponíveis em breve,
Sobre os Insumos
O calibre 38 TPC traz consigo a conveniência de utilizar muitos dos mesmos insumos que o 9mm Luger, facilitando a adaptação dos operadores de recarga. Vamos explorar os detalhes:
- Projéteis: Os projéteis do 38 TPC são idênticos aos do 9mm Luger. Isso significa que você pode usar projéteis com diâmetro de 0,355 polegadas para os jaquetados e 0,356 polegadas para os de chumbo pintados. Além disso, os pesos dos projéteis são os mesmos, como por exemplo, 115, 124 ou 130 grains, proporcionando flexibilidade na recarga.
- Pólvora: A escolha da pólvora é vital para o desempenho, especialmente considerando que as armas para o calibre 38 TPC geralmente possuem canos mais curtos. Para otimizar a queima do propelente nesse espaço reduzido, pólvoras de queima rápida, como a 219 e a 217 da CBC, são as mais recomendadas. Essas pólvoras garantem uma combustão eficiente, mesmo em canos curtos.
- Espoletas: Para o calibre 38 TPC, as espoletas small pistol são as indicadas, como é comum para cartuchos dessa categoria. Essa escolha é previsível e facilita a vida dos operadores, que já estão familiarizados com esse tipo de espoleta.
Os operadores de recarga podem ficar tranquilos, sabendo que a maioria dos insumos necessários para o 38 TPC já está disponível e é amplamente utilizada. Essa compatibilidade não só facilita o processo de recarga, mas também oferece a segurança de comprar um calibre sabendo que os insumos serão facilmente encontrados.
Quanto às Tabelas de Recarga
Uma das partes mais prazerosas da recarga é testar os componentes e construir suas próprias tabelas de recarga. Em breve, teremos uma abundância de informações disponíveis a partir dos testes realizados pelos operadores, e eu mesmo estou ansioso para fazer os meus. A recarga é uma verdadeira comunidade, e o intercâmbio de informações é nosso alicerce e guia nessa jornada contínua de aprendizado.
Conclusão
A introdução do calibre 38 TPC traz uma nova esperança para o público brasileiro que não quer se limitar ao 380 ACP. Criado em resposta às restrições ao 9mm, o 38 TPC chega para enriquecer o acervo de novos atiradores desportistas, além de atrair antigos atiradores interessados em conhecer o calibre. Também é uma opção viável para aqueles que buscam uma arma de defesa pessoal, podendo ser registrada no SINARM.
A grande vantagem do 38 TPC está em sua compatibilidade. As matrizes e muitos dos componentes usados para o 9mm Luger também funcionam perfeitamente para o 38 TPC. Isso significa que, para aqueles que tinham receio de encontrar munição ou componentes para a recarga, podem ficar tranquilos, pois os insumos e ferramentas necessários já estão disponíveis. Com essa compatibilidade, o 38 TPC se torna uma escolha prática e acessível, proporcionando segurança e conveniência aos atiradores, tanto para a prática esportiva quanto para a defesa pessoal.
Autor: Diogo Machado, Advogado Especialista em Legislação de Recarga de Munições e Regulamentações Associadas
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